"Como que levada
pela brisa, a borboleta
vai de ramo em ramo."

Matsuo Bashô

17/05/2011

Sobre Bernard Shaw

 

GEORGE BERNARD SHAW (1856-1950)


Desde jovem eu gostava muito de George Bernard Shaw que faleceu recentemente e que era respeitado mundialmente como grande escritor, ou melhor, como grande homem. Por esse motivo, vou escrever, a seguir, tudo o que me lembro a respeito do velho Shaw.

A maioria das pessoas, quando faz crítica do velho Shaw, só diz que ele é um homem irônico e muito satírico. Sem dúvida, essa também é, obviamente, uma das característica do velho Shaw. Sempre ouço somente esse tipo de críticas, mas é um fato lamentável as pessoas não observarem o velho por um outro ângulo. Sob o meu ponto de vista, acho que ele é uma pessoa sem precedentes, pois, ao ver as coisas, consegue captar com muita precisão a sua realidade e manifestá-la francamente. Em meio ao seu humor irônico, ele manifestava sátiras de forma concisa e aguçada. A palavra era certeira. Ele se assemelhava a um religioso extraordinário.

A seguir, vou escrever de maneira simples aquilo que me recordo. Entre as suas obras, há uma peça teatral famosa, intitulada Discípulo do diabo. Assisti e realmente achei a peça muito engraçada e até fiquei comovido. Em suma, era o seguinte.

Numa cidade pacata da Inglaterra, morava um padre. Durante a sua ausência, veio um policial com o objetivo de prendê-lo por causa de uma acusação. Mas como ele não estava, deixou o recado com a esposa. Esta ficou tão assustada e amedrontada que não sabia o que fazer.

Porém, ali se encontrava um rapaz que havia chegado um pouco antes do policial. Ele era conhecido na cidade como um jovem delinqüente e o seu apelido era “Discípulo do diabo”; portanto, pode-se imaginar como era ele. Não sei que pensamento passou pela cabeça do discípulo do diabo ao ver aquela senhora tremendo diante do policial, mas, repentinamente, voltou-se para o policial e começou a dizer: “Esse crime fui eu quem cometi; portanto, quem deve ir preso sou eu”. Então, o policial pensou consigo mesmo que o rapaz dizia a verdade e que o autor do crime realmente poderia ser ele, devido à vida que levava no cotidiano. Assim, sem desconfiar de nada, conduziu-o à delegacia.

“Discípulo do diabo” fez mexer a consciência.

Momentos depois, o padre voltou e a esposa contou-lhe o ocorrido. À medida que ela ia contando, a sua fisionomia enrubecia mais, a ponto de poder notar claramente a sua agonia espiritual. Isto porque, apesar do seu pensamento constante de encontrar um meio para livrar-se do crime cometido, sentiu remorso pela sua covardia. Foi o discípulo do diabo quem se sacrificou e se entregou à polícia como que debochando daquele sentimento repugnante do padre. Diante da nobre coragem e da manifestação de amor do discípulo do diabo, que se assemelhava ao de um santo, mesmo sendo um notável padre, nada podia fazer em relação ao seu sentimento de humilhação.

Sou apóstolo de Deus, mas se continuar assim, acho que vou me tornar inferior ao discípulo do diabo”; pensando assim, dirigiu-se para a sua fiel esposa e confessou o acontecido. Em seguida, foi rapidamente à delegacia a fim de dar explicações e libertar da cadeia o discípulo do diabo. Como era uma pena leve, foi liberado imediatamente e os dois voltaram juntos para casa. Em seguida, o padre elogiou e agradeceu profundamente ao discípulo do diabo.

O episódio era mais ou menos isso.

Ainda hoje lembro-me nitidamente que, na ocasião, ao assistir essa peça, fiquei deveras comovido.


A seguir, trata-se da peça “A arma e o soldado”, que também era conhecida como “Soldado de chocolate”. Era uma obra que retratava o aspecto de pós-Primeira Guerra da Europa. Era uma peça satírica e pacífica sobre um soldado que estava em guarnição militar e prestava serviço numa vila. Na vila, o soldado sempre agradava as crianças dando-lhes chocolates e vivia uma vida tranqüila e sem preocupações. Recordo-me que era uma sátira de críticas muito severas no que se refere à conveniência ou não da guerra.

A outra era uma peça denominada “Século XX”. Essa também era uma descrição do pensamento da época de pós-guerra da Inglaterra. O personagem principal desta peça era um sujeito extremamente feudal; um coronel aposentado que pode se considerar um conservador típico da Inglaterra. O pensamento desse personagem era tal qual ao dos conservacionistas que restavam na era Meiji, no Japão. Era cabeça dura ao extremo e calcado na arbitrariedade, a ponto de deixar as pessoas da própria família em apuros; por isso, o lar permanecia sempre triste. Por trás dessa cabeça dura, os familiares mostravam a língua e zombavam. Às vezes, os filhos tentavam convencer o pai através de uma nova teoria, mas ele não aceitava. Posteriormente, surgem vários problemas e, devido a isso, aquele personagem vai se abrandando gradativamente, acabando por prostrar-se. Acho que era mais ou menos isso. Como já faz muito tempo que assisti à peça, pode ser que haja algumas partes diferentes, mas na essência era isso.

Vamos deixar de lado os seus dramas e, a seguir, desejo falar sobre alguns ensaios e sátiras de sua autoria.


A minha opinião em relação à comédia dele é a seguinte. A comédia, obviamente, tem por fim fazer as pessoas rirem mas, para provocar o riso, existe uma técnica. Isto é, a desilusão. Por exemplo, se numa cena presenciarmos uma pessoa bem vestida e de barba bonita passar majestosamente montada num cavalo e, no cenário seguinte, se essa mesma pessoa aparecer montada no cavalo totalmente nua, sem querer, passamos a rir por causa dessa desilusão.

Dessa maneira, ele, arrancando audaciosamente os adornos, as ameaças vãs e as tradições que envolvem o mundo, nos mostrou com toda franqueza. Podemos dizer que isto é o segredo da comédia. Esse ponto de vista é que realmente se centralizava nas ironias e sátiras criadas por ele. Em suma, ele falava francamente, de forma nua e crua, aquilo que pensava. Ele era, naturalmente, sempre sincero. O seu caráter também. Acho que jamais existiu um outro grande escritor tão sincero como ele. Por isso, a sua ironia não era uma ironia para ironizar. A revelação das realidades acima citadas é que tem se tornado em ironia.

Soube que aconteceu também o seguinte. Certa vez, ele fez uma palestra diante de um grande público. De súbito, ele disse o seguinte: “Acho que com a cabeça que os senhores aqui presentes têm, não vão entender o sentido da conversa que pretendo expor agora”. Então, o auditório explodiu de risos. Aqui encontra-se a sua atração misteriosa. Normalmente, quando recebe uma ofensa como essa, o auditório fica deveras revoltado; no entanto, o fato de ter acontecido o contrário deixou evidente o quanto ele era amado pelo público. Também aconteceu o seguinte. Uma escritora famosa disse a ele: “Se uma pessoa inteligente como o senhor casasse com uma pessoa como eu, certamente nasceria um filho maravilhoso e inteligente, não é verdade?”. Ele retrucou imediatamente: “Não. Isso não é verdade. A criança que nascer entre uma pessoa como eu, que tenho fisonomia feia, e você, que possui uma cabeça ordinária, com certeza não prestará”.

Uma outra sátira que achei muito engraçada foi quando ele disse que o amor é algo necessário concedido por Deus ao homem a fim de preservar a raça humana. Como ele era dinâmico! Creio que não existiu pessoa tão cheia de auto-confiança como ele. Dizem que ele sempre afirmava o seguinte: “Shakespeare é considerado realmente o mais importante da Inglaterra, mas, dizendo a verdade, eu sou mais do que ele”. Mas isso, ao contrário do que se pensa, não se trata de presunção ou orgulho seu. Ele apenas dizia sinceramente aquilo que pensava. Essas palavras, que normalmente podem ser vistas como megalomaníacas, quando saem através da boca dele, não se tornam hediondas, e as pessoas aceitam com prazer. Aqui verifica-se a sua grandiosidade. Nos seus últimos anos de vida, os intelectuais da Inglaterra solicitavam a sua opinião em relação a vários problemas que surgiam e usavam-na como referência. Através disso, podemos perceber quão grande era a sua existência. Foi uma pessoa que inclue-se entre as pessoas célebres do século XX.

Mokiti Okada - Jornal Eiko n° 78, 15 de novembro de 1950







George Bernard Shaw
(Escritor irlandês)
26-7-1856, Dublin
2-11-1950, Ayot Saint Lawrence, Grã-Bretanha




Shaw é autor de mais de 70 obras teatrais e de numerosas críticas sobre arte e críticas sociais. Recebeu o Prêmio Nobel de Literatura em 1925 e é considerado o fundador do teatro moderno inglês. Muitas de suas obras são qualificadas de "peças-idéias", pois tanto a ação como a linguagem e as personagens giram em torno de um leitmotiv, uma idéia ou uma concepção do mundo particular. Influenciado por Hendrik Ibsen, desenvolveu a ação teatral como uma forma de discussão. Shaw expunha seus princípios críticos por meio de diálogos tensos, dotados de grande criatividade. Nas primeiras obras, retrata a sociedade vitoriana acomodada, cuja hipocrisia moral desmascara em Mrs. Warren's Profession (1894). Em Candida (1894), surge o moralismo ilustrado de Shaw, que coloca em evidência a estreiteza de horizontes do sexo masculino por meio de suas personagens femininas, inteligentes e plenas de senso comum. Recriou igualmente temas históricos, como César e Cleópatra (1901). Em dramas posteriores, como Man and Superman (1903), manifestam-se a evolução de seu pensamento e suas crenças na força da filosofia vitalista. Também escreveu Pigmalião (1913), que adquiriu fama mundial graças à sua versão musical, chamada My Fair Lady (1956). Shaw, cuja infância como filho de um alcoólatra não foi particularmente feliz, exerceu as profissões de agente imobiliário e de jornalista. Antes de alcançar o sucesso na literatura e no teatro, adquiriu renome como crítico teatral, artístico e musical.
 
Dotado de uma criatividade indiscutível e de uma linguagem corrosiva, reivindicou uma série de reformas sociais e culturais. Em 1884, ingressou na Fabian Society, uma instituição que impulsionava as reformas sociais. Recebeu o Prêmio Nobel de Literatura "pela obra poética, marcada pelo idealismo e pelo humanismo, e especialmente pela poderosa sátira, na qual flui uma beleza poética muito pessoal".
 
 

Obras

  • The Quintessence of Ibsenism (1891)
  • Widower's Houses (1892)
  • Mrs. Warren's Profession (1893)
  • Candida (1894)
  • O famoso ídolo (1896) (Cashel Byrons professional)
  • Plays Pleasant and Unpleasant (1898)
  • Three Plays for Puritans (1901)
  • The Devil's Disciple (1897)
  • Caesar and Cleopatra (1901), citada com sua primeira grande obra
  • John Bull's Other Island (1904)
  • Casamento desigual (1905) (Irrational knot)
  • Man and Superman (1905)
  • Major Barbara (1905)
  • Pygmalion (1913), sua peça mais conhecida e que inspirou o filme My Fair Lady (1938), o musical homônimo (1956) e um novo filme (1964)
  • Heartbreak House (1920)
  • Back to Methuselah (1922)
  • Saint Joan (1923)
Fontes: http://pt.wikipedia.org/wiki/George_Bernard_Shaw
           http://www.netsaber.com.br/biografias/ver_biografia_c_1035.html

 

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